Assistir aos jogos do Corinthians nos últimos tempos pode parecer um desafio. Afinal, com uma sequência incômoda de cinco empates consecutivos, o Timão acumulava críticas e explicações fajutas pelo seu desempenho. Porém, em partida válida pela nona rodada do Campeonato Brasileiro contra o Atlético-GO, fora de casa, Vitor Pereira nos deu um recado. O Corinthians segue buscando o seu melhor futebol, e isso é um processo longo e árduo.
Esta desculpa parece ser a mesma utilizada em tantas entrevistas coletivas por ai. O torcedor pode, portanto, compilar uma série de falas semelhantes de diversos técnicos – do Corinthians ou de adversários. E ele, portanto, se provará certo. Porém, é raro notar evoluções, ainda que simples, em times que batem no escudo para dizer que estão se reconstruindo. O Corinthians, ontem, mostrou uma evolução mínima. Mínimo é mais do que nada.
A vitória não apaga o desempenho ruim. Não esconde a falta de entrosamento em jogadores que atuam juntos há meses. Não tira do foco atuações apagadas de jogadores de estirpe. Porém, é preciso contextualizar. O Corinthians demonstrou em campo espírito vitorioso contra um time que tem muito mais a perder. O dragão buscava desesperadamente uma mudança de ares e esboça uma reação, mas foi parado por um jogo bem pensado.
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O grande nome do Corinthians: a indivualidade
Ao abrir os veículos de notícia esportiva, afinal, é normal ler sobre algum grande nome dos times competitivos. Atlético-MG tem Hulk. No Palmeiras, Raphael Veiga. O São Paulo exalta Calleri. Todos eles falíveis, mas decisivos nos momentos necessários. No Corinthians, entretanto, este nome não existe. Há quem cite o Cássio, e isso é inegável, mas vamos nos ater aos jogadores de linha. Hoje, portanto, o Corinthians não tem por ali uma referência.
Renato Augusto assume a liderança quando necessário. Jô, portanto, faz o mesmo quando vê a oportunidade. Fábio Santos tem sido importantíssimo na defesa, aliás. Mas o Corinthians não tem um “homem gol” há tempos. Talvez justamente por isso, hoje, a torcida clame pelo retorno de nomes como “Angel Romero”, ou ainda sonhe com um Cavani pelo Parque São Jorge. São sonhos distantes, mas que remetem ao torcedor esta necessidade.
Há uma vaga disponível e diversos candidatos à disposição. Porém, falta a responsabilidade para tal. O que estes nomes têm em comum, além da fome de gol, é o olhar carinhoso para com sua equipe. Existe ali uma séria noção de coletividade que os obriga a pensar no time antes de suas próprias glórias. Hoje, o Corinthians possui uma equipe forte, mas uma necessidade individual maior ainda. Nossos “homens gol” tropeçam em suas próprias vaidades.
“Quem não corre, não joga”
Vitor Pereira escancarou os bastidores dos treinamentos de forma desnecessária ao criticar Roger Guedes para a imprensa. Há, porém, uma centena de maneiras de dizer o que ele queria sem colocar a si mesmo e ao jogador na fogueira. Quando disse que ele entraria quando demonstrasse vontade em treinos e jogos, Vitor Pereira deixou claro que, naquele momento, não confiava no jogador. Hoje, é possível entendê-lo.
Vitor Pereira poderia ter dito que ele e sua comissão técnica estavam “trabalhando características” do jogador para se encaixar no time. Poderia ter dito que estava realizando um trabalho comportamental. Tudo se encaixaria melhor do que suas palavras originais. Mas é impossível, hoje, dizer que o técnico exagerou no contexto de sua frase. Ontem, Roger Guedes provou para a torcida que não é o salvador da pátria, mas o anti-herói.
Decisivo ele, sem dúvida alguma, é. Talentoso, mais ainda! Porém, não é possível olhar para a sua postura dentro das quatro linhas e caracterizá-la como “exemplar”. Guedes tropeça no seu próprio desejo de ser maior, e, quer queira, quer não, espera que os outros o procurem. Não é um nove de função, é um atacante de extrema qualidade, mas lhe falta espírito de equipe. Ontem, com lentidão e desistência, Roger Guedes deu vazão às palavras perigosas de VP.
A consistência de peças importantes
Se houve um breve lapso da postura competitiva do Corinthians nos últimos jogos, o time quer deixar isso para trás. Ontem, apesar de jogar fora de casa e contra uma equipe que busca ar dentro de um campeonato de pontos corridos, o Corinthians mostrou-se forte. Não o mais forte, mas resistente. O Atlético-GO foi superior em alguns momentos do jogo, principalmente no início, mas, por meio da consistência, o Corinthians readquiriu a tranquilidade.
A marcação de Robson e Gil, embora falha, mostrou-se decidida. Além disso, a presença constante de Fábio Santos na defesa desafogou os dois jogadores, que raramente atuam juntos. O experiente lateral esquerdo, inclusive, é polivalente e onipresente, já que fez até as vezes de falso nove ontem também quando necessário. Sua interação com Renato Augusto e Giuliano foi de dar inveja, e as construções de jogadas funcionaram bem quando começavam ali.
No ataque, a presença de Adson tem sido de extrema importância. Rápido e com boa resistência física, o jogador tem facilidade para quebrar as linhas de marcação adversária e é boa opção na área. Além disso, tendo Renato como referência e Giuliano como apoio central, Adson tem mais liberdade para transitar. O erro do meio campo de ontem foi ter apostado no camisa oito como falso nove – coisa que nunca foi – e prender sua criação.
O coletivo que pede passagem no Corinthians
Embora sofra com as finalizações, o Corinthians se mostrou confiante quando joga junto. No meio de campo, o Timão se apresentou de forma imponente, e soube controlar a posse de bola, principalmente após o gol de Gustavo Mantuan. Já muito criticado por mim, o garoto mostrou ontem que sabe correr, mas que funciona melhor se pode aparecer na área. E funcionou bem!
Mas o destaque para o gol da partida não fica na bela cabeçada para o fundo das redes. É preciso, portanto, exaltar a participação coletiva. Quando joga junto, o Corinthians ocupa muito bem os espaços do campo e sabe se aproveitar dos lugares onde consegue entrar. Quando recebe a bola interceptada por Adson, Du Queiroz dá o perfeito exemplo: é veloz e agil para entrar na área, inteligente para encontrar Piton e este é rápido para ver Mantuan. Gol do Terrão.
Eis a importância, portanto, de ouvir o que o técnico diz. Quando Vitor Pereira pede para subir as linhas, os sinais indicam que todos devem subir. A marcação é conjunta para que o individual seja favorecido. Em harmonia, as habilidades específicas podem brilhar, e o coletivo pode atingir o objetivo final. Objetivo este que dever claro: o bem-estar do Corinthians. Este, sim, é maior do que aqueles que vestem o manto.
O Brasileirão é traiçoeiro
Todos os dias, ouço comentaristas dizerem: ser líder na nona rodada não altera o campeonato. Mas altera. Começar bem um campeonato de pontos corridos tem que dar aos jogadores de dito time o tesão para manter-se na posição. Além disso, o nível deve continuar a subir para conter aqueles que se aproximam ao longo das rodadas. Justamente por isso, qualquer ponto é ponto – principalmente aqueles disputados fora de casa.
Ontem aconteceu, portanto, um duelo de opostos. A vitória colocava o Corinthians na frente do campeonato mais uma vez. Para o Atlético-GO, significava uma brisa fresca fora da degola. Ambos os times tinham noção disso. Porém, prevaleceu aquele com 0,5% a mais de consistência, principalmente defensiva. O Corinthians soube se defender bem e aproveitar aquilo que lhe era deixado.
A palavra “construção” também pode soar como uma desculpa para explicar performances abaixo, mas ela também mostra evolução. O Corinthians demonstra traços disso em suas partidas. A torcida segue apoiando, mas não é cega. Justamente por isso, para a comissão técnica, o trabalho deve ser redobrado. Para os jogadores, é preciso consciência. O Corinthians deve ser o objetivo final; as demais glórias serão consequências. Tem que ser pelo Corinthians!