Quando o volante Maycon voltou ao Corinthians por empréstimo, a torcida tinha uma imagem do jogador ainda gravada na memória. O último pênalti, batido pelo jovem jogador, na final do Campeonato Paulista de 2018 na casa do maior rival, tornou-se uma das imagens preferidas das torcida. E não é para menos. Mais do que a batida, houve, porém, o simbolismo.
Maycon, formado no Corinthians, provou-se, portanto, um verdadeiro Filho do Terrão. É preciso entender: carregar este título vai, primeiramente, muito além de sua formação inicial no futebol. É preciso entender verdadeiramente o que é ser Corinthians para ostentar este título. Ontem, na vitória contra o Boca Juniors pela CONMBEBOL Libertadores, Maycon provou que, de fato, entende. Mais do que os gols que marcou, foi o portador da grande atitude Corinthians.
Esta atitude, porém, foi mais determinante do que o resultado. Com o sangue e dedicação de Maycon e dos demais jogadores, o Corinthians foi embalado pela torcida para vencer com autoridade o Boca Juniors dentro de casa. A vitória, claro, é importante, mas é secundária. A torcida orgulhou-se, entretanto, da entrega e da devoção do time. Ontem, o Corinthians foi, de fato, o Corinthians.
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A presença mesmo na ausência
A partida de ontem valia muito ao Corinthians. Mais do que a liderança de seu grupo na Libertadores, a vitória seria uma libertação. Afinal, comissão técnica, diretoria e jogadores colocavam aquela como a grande prioridade do Timão. Depois de atuações frustrantes contra Portuguesa-RJ pela Copa do Brasil e contra o Palmeiras pelo Campeonato Brasileiro, a vitória serviria como um “pagamento de promessas” para a torcida.
Justamente por isso, o anúncio da ausência de Vitor Pereira na beira do campo, diagnosticado com COVID-19, foi um baque muito forte. Seu auxiliar, Felipe Almeida, deveria comandar a equipe nos últimos treinamentos e na partida, propriamente dita. O trabalho seria mantido e o estilo corinthiano não deveria mudar, mas perder temporariamente o técnico na partida mais importante até o momento parecia mal presságio. Não foi.
Mesmo distante da Neo Química Arena, Vitor Pereira marcou sua presença através de suas impressões digitais no time. Ontem, pela primeira vez desde a sua chegada, o Corinthians fez um jogo com a cara do técnico português. Com marcação acima da linha de meio campo, sufocou as saídas de bola na defesa argentina e anulou os adversários. Além disso, no ataque, trabalhou a bola e chegou com velocidade. No campo, via-se Vitor Pereira.
A vitória do Corinthians se construiu na entrega
Se a tática estava bem montada, faltava, então, colocá-la em prática. Para isso, sem dúvida, seria preciso entregar-se dentro de campo. E ontem, verdadeiramente, viu-se a raça corinthiana aplicada num jogo bem armado e bem jogado. Como já diria o outro, ninguém saiu de campo com o uniforme limpo. Com estádio lotado e com as vozes da torcida ecoando por toda a Neo Química Arena, o Corinthians deixou a todos orgulhosos.
Tecnicamente, o time funcionou bem. Tão bem, entretanto, que há quem tenha estranhado. No meio de campo, Du Queiroz e Maycon puderam avançar mais com a marcação acirrada do Corinthians. Renato Augusto pôde, portanto, fazer suas vezes de armador e comandar a criação de jogadas. Pelas laterais, Fagner e Fábio Santos demonstraram experiência e visão jogo ao acompanhar o ataque e, ainda assim, marcar forte presença na defesa.
A linha defensiva, muito criticada anteriormente, provou que sabe aprender com os próprios erros. João Victor e Raul Gustavo alinharam seus estilos de jogo e cumpriram seu papel com muita serenidade, sem se perder no desespero de um grande jogo. Para dois jovens jogadores, entretanto, era difícil se esperar isso. Porém, ambos entraram com segurança nas bolas disputadas e souberam lidar com a pressão.
No ataque, Jô viveu uma de suas grandes noites nesta nova passagem. Apesar de não ter deixado seu gol, apareceu bem na entrada da área e, atuando como pivô, deu mais liberdade a Willian, pela esquerda, e Adson, pela direita. O garoto, inclusive, fez excelente partida e foi importantíssimo para a construção do ataque. Além disso, sua dupla com Fagner pela direita funciona muito bem e rende boas tabelas para a chegada na área.
Ainda é preciso mudar
No segundo tempo, ciente da necessidade de ampliar o placar sem perder a característica de marcação, Felipe Almeida mexeu rápido. Ainda no intervalo, tirou Adson e Jô no ataque e colocou Gustavo Mantuan e Roger Guedes. Com o camisa 9 mais centralizado, coube a Willian e Mantuan darem vazão a sua presença. Porém, Willian já demonstrava cansaço e Mantuan não conseguiu, mais uma vez, acompanhar o ritmo da partida.
Enquanto Adson e Fagner ensaiavam boas jogadas de ataque e o camisa 28 puxava as arrancadas para o meio de campo buscando opções de passe ou chute, o 31 não conseguia. Prendeu-se na falha marcação do Boca Juniors e, na melhor chance que teve, tropeçou na bola em tabela com Fagner. Sua entrada tirou velocidade e dinamismo do jogo, mas não atrapalhou o resultado.
Pelo outro lado do campo, Fábio Santos deu show. Sua experiência em jogos de grande porte e sua forte presença defensiva foram definitivas para a construção do sistema corinthiano. Foi a partir dele, inclusive, que nasceu a jogada do segundo gol. Com Roger Guedes cobrindo o cansaço de Willian pela esquerda, o camisa 9 arrancou pela lateral, entrou com perigo na área e bateu, para a defesa do goleiro. Maycon, oportunista, não perdeu a chance e ampliou.
Porém, se Willian demonstrava sinais de cansaço e Guedes tem atuado bem pela esquerda, por que não colocá-lo lugar do camisa 10 no segundo tempo? Puxar Roger Guedes como centroavante é um risco alto, tanto para o jogador quanto para o técnico. Ontem, não surtiu, portanto, o efeito esperado. Quando se arriscou pela esquerda, conseguiu levar perigo e se impor. Mas Roger Guedes não é centroavante.
A esperada mudança de chave no Corinthians
Para além do bom futebol, o Corinthians apresentou ontem grande atitude dentro de campo. Grande parte dela, afinal, partiu do camisa 5. O início deste texto o retrata como “o verdadeiro Filho do Terrão”, e reitera tal afirmação. Maycon jogou com raça, trouxe o espirito das arquibancadas para dentro de campo e soube o momento certo de agir. Em início de confusão entre João Victor e Benedetto, é ele que tira o amarelado zagueiro do tumulto e o aconselha.
Maycon não portava a braçadeira de capitão ontem. Tal honraria segue com o goleiro Cássio que, ontem, pouco trabalhou. Mas ele assumiu uma posição da qual o Corinthians estava carente: a de xerife. Pela calma, paciência e presença ativa no jogo, foi determinante para os seus companheiros, que, de certa forma, espelhavam-se em sua atitude. Ao lado dele, Renato Augusto, Fagner, Fábio Santos e o próprio Cássio demonstraram o mesmo.
Esta é a mudança de chave que o corinthiano deseja. Para o Timão, é preciso voltar a ser Corinthians! Os resultados virão a partir desta atitude. O jogo de ontem, afinal, provou que esta afirmativa é verdadeira. A vitória é importante para o time, mas deve representar mais do que os três pontos. É preciso representar uma mudança de chave real, para que o Corinthians continue sendo o Corinthians em todas as competições que virão.