Nasci numa família puramente corinthiana. Meu pai, Roberto, é o cara mais apaixonado pelo Corinthians que eu já conheci. Naturalmente, não foi surpresa, portanto, que seus filhos herdassem dele esta paixão. Por isso, criou a mim e aos meus irmãos na base do corinthianismo. Os dias de jogos eram sagrados, e ele, de forma natural, transformou o Pacaembu no nosso quintal. Depois, a Neo Química Arena virou o lar que tanto queríamos.
Crescemos vestindo camisas do Timão – originais ou não – e tínhamos orgulho disso. Acompanhamos juntos, portanto, os melhores e piores momentos do time lado a lado, e sonhávamos com a “glória eterna”, também juntos. Foi assim que eles nos ensinou: o Corinthians era fator de união; o Corinthians era a nossa família. Eu, então, aprendi assim! Mas naquele 4 de julho de 2012, nossos sonhos conjuntos se tornaram realidade.
Aquele dia não nasceu para ser normal. Na verdade, nem deveria! Havia um grito entalado na garganta, uma esperança presa no peito e uma ansiedade que não cabia no corpo. Era dia de jogo, e dia de jogo era sagrado! Mas não era qualquer jogo: era o dia da glória eterna! Esperávamos ansiosamente por um momento que pareceu nunca chegar, mas que, quando chegou, transformou a todos para sempre.
O ritual corinthiano da família Andrade
Minha mãe não é a pessoa mais ligada em futebol do mundo. Ela, na verdade, assite aos jogos por nós. Porém, meu pai, eu e meu irmão, Guilherme, assistimos religiosamente a todas as partidas. Mas aquela Libertadores foi diferente. Assistimos ao primeiro triunfo em posições aleatórias no sofá e, quando o resultado se provou positivo, marcamos os lugares. Virou superstição: era jogo de Libertadores, nos sentávamos em jogral e assistíamos apreensivos.
Eu tinha uma camisa velha, comprada na porta do Pacaembu, do antigo goleiro Felipe – aquela azul, ainda com o “Batavo” na frente. Assisti ao primeiro jogo da Libertadores com ela e, portanto, ela me acompanhou até a final. Não seria eu a azarar o Corinthians usando uma camisa diferente. Comemorávamos com força a cada jogada bem formada, sofríamos com os erros e comemorávamos as conquistas – na mesma posição do sofá, com a mesma camisa.
Após o fim da partida, era cada um para um canto lidar com o resultado. Às vezes um empate amargo ou uma vitória sofrida. Porém, independentemente de qual fosse o placar, era difícil de dormir. Conforme passos eram dados e o nosso Corinthians se aproximava da decisão, o coração apertava um pouco mais. Afinal, todo corinthiano sabia dentro de si: aquele 2012 era, portanto, nosso!
O Corinthians x Vasco que nos levou à final
O jogo entre Corinthians e Vasco foi a minha certeza: o Corinthians seria campeão da Libertadores da América em 2012. Ora, era impossível! Como aquela partida aconteceu, da forma como aconteceu, se o caneco não estivesse destinado a ser nosso?! Houve, entretanto, quem duvidasse da minha certeza. “O campeonato é muito longo. Os próximos jogos serão mais difíceis, é bom se preparar”. Mas eu, não. Eu sabia – dentro de mim, eu sabia!
Não era a toa. Cássio nos deu o título da Libertadores naquela defesa histórica, cara a cara com Diego Souza. O jovem goleiro que assumiu o gol corinthiano não parecia, entretanto, assustado com a tarefa. Quando o atacante vascaíno abre com velocidade e ganha vantagem sobre os defensores corinthianos, Cássio está adiantado. Porém, não treme. Não hesita. Com a calma e a precisão que só ele poderia demonstrar, tirou aquela bola com a ponta dos dedos.
O gol de Paulinho no fim do jogo foi uma recompensa histórica pelos feitos de Cássio. Depois do milagre performado, portanto, não tinha como: o Corinthians tinha que passar. A vaga era nossa. A cabeçada do volante coroou uma noite de euforia para o torcedor corinthiano. Foi ali, portanto, que eu soube. Os mesmos dedos que afastaram a bola de Diego Souza tocariam a taça da Libertadores e a trariam para casa.
De cabeça erguida, era Dia de Corinthians!
Foi com essa cena em mente que me sentei no meu lugar marcado no sofá para assistir àquele Boca Juniores x Corinthians. Sentei, respirei fundo e esperei o apito inicial. A partir daí, ninguém mais falou. A sala foi tomada por um silêncio ensurdecedor, quebrado momentaneamente, porém, por gritos esporádicos. Era um toque errado, uma bola perdido ou um chute desperdiçado. Era Dia de Corinthians, e a atmosfera era diferente.
No intervalo, minhas palmas já estavam machucadas de tanto apertar minhas unhas contra elas. Achei verdadeiramente que sairia daquele jogo sangrando. Mas a agonia daria lugar à euforia – e muito em breve! Com oito minutos do segundo tempo, Danilo ajeitou de calcanhar para um Sheik preciso, e eu só ouvi o barulho da torcida. Mas não vi a rede balançar. Já tinha corrido para fora, gritando a plenos pulmões em comemoração.
Pouco depois, aos 26, o mesmo Sheik roubou a bola do Boca Juniors e não parou mais de correr. Acredito, inclusive, que se fizermos silêncio o suficiente ainda o ouviremos correr. Senti como se ele tivesse atravessado as redes. Corremos juntos para fora de casa, gritamos e comemoramos com os demais corinthianos da rua. A curiosidade é que meus vizinhos da frente, palmeirenses, apagaram as luzes assim que o segundo gol saiu. Era a confirmação.
O Corinthians mudou a minha vida
A partir do segundo gol, nós comemoramos ativamente até uma bola que balançou as redes por fora. Corremos novamente para a rua, mas não valeu. Estava tudo bem. Entretanto, minha pobre camisa do Felipe sofreu um rasgo no colarinho. Mas não me importei. Com o apito final, o grito preso na garganta saiu com força. Estávamos libertos! O Corinthians era campeão da Copa Libertadores da América 2012!
Naquele dia, apesar de ter nascido e sido criada corinthiana, eu finalmente entendi. Era muito mais do que futebol; aquilo era o Corinthians! Gigante, guerreiro e corajoso, aquele era o Corinthians campeão da Libertadores da América 2012! Como eu sabia que seria. Foi naquele momento que eu, portanto, fui capaz de compreender a dimensão daquele time. E aí ficou claro: eu não escolhi o Corinthians, porém, ele me escolheu.
Foi o Corinthians que me colocou no mundo do esporte e que me fez querer entender o que é o futebol. Foi pelo time que, portanto, sofreu com o rebaixamento, que reviveu Ronaldo Fenômeno, que comemorou os gols de Liedson. Mas, mais do que isso, foi o time que parou gols feitos, que cabeceou com certeza, que furou as redes. O Corinthians me fez o que eu sou. Portanto, obrigada, Corinthians!