Eu nunca aprovei a vinda do Tiago Nunes para o Corinthians, embora entendesse que após o cargo de técnico vago, ele era de fato a menina dos olhos do futebol brasileiro no momento. Tinha o apoio do torcedor nas redes sociais e da imprensa no geral. Parecia ter feito milagre no Furacão.
Mas chego a glorificar de pé a entrevista do Carille para o Benja já na época que foi pro ar, dizendo que Tiago precisaria de jogadores para jogar como jogava no Athletico e que ficaria surpreso em caso de sucesso. A falta de elenco era o meu contraponto para a sua vinda e para a pressão descabida no time desde Maio de 2019.
Além da plena convicção de que o cara pra chegar no Corinthians e fazer a coisa acontecer, tem que ser de outro nível, mesmo com elenco qualificado.
Não é só saber de futebol, não. É uma série de outros fatores também. E honestamente eu não esperava isso do Tiago.
É conhecer como a roda gira aqui no clube, é suportar pressão no aeroporto, é saber gerir elenco, é dar entrevista da forma que o torcedor gosta, é entender que a torcida quer resultado, é saber a regularidade das notícias pra vender likes que tumultuam ambiente, e claro, além disso tudo, precisa de futebol bonito, vitória em clássico, jamais ficar 3 jogos sem vitória, títulos e tudo mais que possa vir ao mesmo tempo. E se possível rápido.
Há uma outra declaração do Carille em 2017, que explica um pouco mais a essência disso. Ele conta que já havia o medo de fracassar na Florida Cup no início do ano, pois, por trabalhar no clube há anos, sabia que um início frustrante mesmo em uma competição minúscula e café-com-leite, já poderia ser motivo para prejudicar o andamento do trabalho pois rolaria pressão. Ainda mais para ele, uma cara desconhecida e sob desconfiança à frente do time em um cargo importante. Era um mero interino tapa buraco no clube até então. Tanto que realmente perde para o São Paulo nos pênaltis e já enfrenta mesmo esse cenário de cobrança nas primeiras semanas de trabalho (a coisa só anda depois do gol do Jô contra o Verde).
E não há declaração mais CORINTHIANS, do que essa. E é preciso de tempo de casa pra entender esse cenário. Ou você lapida o tempo sem perder jogos bobos, fazendo resultados, sem deixar a temperatura ferver e, paralelamente, vai fazendo o time crescer, ou é rua. Não ter as duas coisas ao mesmo tempo não funcionam. Foi o que Tiago não soube dosar. Já chegou tirando onda e escalando errado na partida mais importante da temporada. Não era hora pra invenção. Jogar bonito viria com o ano. Manter seu cargo era mais importante que implantar filosofia de jogo em janeiro/fevereiro. E ele já faz tudo errado na condução no jogo do Paraguai na pré-libertadores, escalando time sem primeiro volante, errando na preferência de Sidcley extremamente fora de forma, e dando passagem para Everaldo, Janderson, VItal e até MADSON, ao invés de deixar o jogo cascudo com Vagner Love que nem entra em campo. Este inclusive, no jogo da volta, fura a fila de 4 jogadores, começa o jogo como titular e participa bem da partida. Não há explicação de colocar um menino chamado Madson em jogo da vida em estreia de Libertadores e deixar o Love no banco. Ali eu já sabia que a vinda dele daria errado. Comprovou não entender NADA de Corinthians já nos primeiros suspiros do trabalho.
Coudet no Internacional inclusive fez exatamente o que acabo de explicar. Quem ainda está empregado?
Carille também reforça algo parecido em 2019, sobre a necessidade de manter um equilíbrio entre evolução de futebol e resultado. Após demissão, entende que exagerou na dose do resultado, mas fracassou na evolução do futebol durante o ano e rodou.
Boa parte da torcida parece não enxergar esses pontos nas entrelinhas. E é justamente neles que parecem nascer o nosso DNA.
Resumindo, o treinador vai chegando aos poucos, com medo de soltar o time e as ideias 100%, e acaba jogando por uma bola com frequencia pra garantir o emprego e a longevidade. Tá errado?
DNA de Retranqueiro?
Ninguém em sã consciência prefere jogar com 10 atrás da linha bola. Sou apaixonado por futebol.
Se eu fosse escolher entre jogar como Sampaoli e Guardiola ou jogar como Tite, Mano e Carille jogaram uma década TODA nos confrontos fora de casa por exemplo (fora de casa, ok?), não há a menor possibilidade de eu preferir a segunda opção. Mas se é pra jogar feio quando necessário pra ser campeão, evitar crises e montar times duradouros, eu quero mais é que se exploda. E até parece que de 2009 pra frente a gente nunca mais jogou bonito, nunca mais goleou ninguém, que ganhamos uma porrada de coisa só jogando feio. Não tem milagre, se fosse feio não ia ganhar tudo.
O torcedor mais antenado, percebeu essa pressão exagerada no cargo de treinador e no clube em geral há muito tempo e respeitou, inclusive no estádio. Não foram poucas vezes que o time jogou estrategicamente e a torcida abraçou.
Tais técnicos e provável que diretoria, dirigentes e demais funcionários, também perceberam isso. Time organizado ou organização defensiva não é retranca. A ideia de jogo padrão do pós-rebaixamento, tem mais que um DNA chamado “retranca”.
Tem um DNA chamado “cautela”. Ou um DNA chamado “abafa a pressão”. Um DNA chamado “futebol brasileiro”. Um DNA chamado “é melhor fechar a casinha”.
Ou melhor, ter um DNA para o clube por si só já é melhor do que não ter. O Palmeiras é campeão brasileiro com Cuca em 2016, no outro já tem outro técnico, 2018 outro, depois Mano e agora Luxa. Que doideira é essa? Ainda mais com dinheiro!
Isso tudo de cautela inclusive não é exclusividade do Corinthians. É claro que a pressão aqui, até pelo tamanho e personalidade da torcida, é um pouco acima do normal. Mas lidar com tudo isso, vestiário, torcida e competir conforme a música, como foi feito, um dos grandes acertos recentes inclusive, já se torna um diferencial onde outros clubes se perderam, enquanto nós obtivemos como grande legado.
Os clubes como um todo, se perderam demais na contratação de novos técnicos em meio de temporada, até por essa sede ao pote que talvez teve Tiago Nunes. Nós batemos recordes positivo de pouca troca de técnico desde 2008. Porque não tem milagre. Precisa de qualidade pra ganhar título. Se o elenco não é bom, precisa de bastante tempo. Se o elenco é bom, precisa de um pouco menos tempo, mas ainda assim, é necessário normalmente ali seus 6 meses. As bases vencedoras do Corinthians, tiveram anos para serem lapidadas. O time campeão do Mundo em 2012, ainda era base de alguns anos recentes. Uma mistura de jogadores que vinham de temporadas passadas. Chicão e Alessandro com 5 temporadas de clube. Jorge Henrique com 4. Ralf, Danilo e Paulinho com 3. E assim vai. As coisas não funcionam no “toma aí, vai lá e resolve”. Não funciona nisso de “não deu certo, troca de técnico”.
Mas no Brasil, muitas vezes precisou ser assim na maioria dos clubes clubes. E aí que o tal DNA da retranca ou DNA de alguma coisa, virou algo padrão não só no Corinthians, mas sim no Brasil. Uma marca que gerou novos técnicos engessados, que é inclusive causa principal desse futebol feio que temos atualmente. O futebol de resultado. O futebol com vários problemas de uma vez: cartolagem, torcida que pressiona, desmanche em elenco o tempo todo, falta de qualidade de mão-de-obra pelos novos mercados de futebol mundo afora, excesso de jogos, calendário de seleção que desfalca os poucos talentos dos clubes. É uma porrada de acontecimentos simultâneos, que foram levando ao cenário atual.
Desde o rebaixamento, o técnico que chegasse no início de temporada no Corinthians, tinha que entender isso. Ou lapida o tempo jogando por resultado e trabalha com tranquilidade pra formar os times a longo prazo, ou a batata vai assar e a demissão será certa.
Eu poderia ficar horas aqui falando o que penso do Corinthians dos últimos anos, o que acho que deu certo, que deu errado, porque deu certo e porque deu errado. Mas não entendo como é tão difícil entender que a receita que funcionou nos últimos anos foi a “retranca”.
Ninguém funciona sob pressão. E é pressão de todo lado. Nosso time é uma bomba relógio. Ganhar uma libertadores, só poderia ter sido como foi. Impecável, invicta. Sem perder fora, porque recuperar-se de um revés fora de casa, sempre foi algo bizarro, pela pressão da nossa grandeza. A receita mano/tite/mano/tite/carille/retorno carille, funcionou por isso. Os caras entenderam isso. Os três. Perceberam essa brecha no sistema da nossa grandeza. Ganhamos campeonatos com uma facilidade jamais vista antes na nossa história. Tudo por causa desse jeito “feio” de jogar.
Desse jeito conservador, mas que funcionou tão perfeitamente aqui, por isso tudo que vos digo: PRESSÃO.
Acompanho o Corinthians desde 1994, e sempre fiquei encucado como os grandes clubes e o futebol absorvem pressões que queimam energias de jogadores, comissão, dirigentes, comissão técnica. E com o Corinthians isso sempre foi multiplicado. Perdemos títulos, jogos, jogadores, por causa de goleadas, eliminações. Tomamos pouquíssimas goleadas nos últimos anos, uma delas, em 2014 pro Santos, tivemos invasão de CT e tudo o mais, e os tempos nem eram obscuros.
O técnico novo precisa saber disso tudo.
Porque por incrível que parece, tem torcedor que não sabe.