Cássio x Diego Souza: Relembre essa defesa histórica
O relógio apontava 23 horas, 23 minutos e 20 segundos do dia 23 de maio de 2012 quando Diego Souza corta um cruzamento de Alessandro e parte livre rumo à meta defendida por Cássio. Começavam ali os oito segundos mais angustiantes da história do Corinthians.
23 horas, 23 minutos, 21 segundos. Diego arranca em alta velocidade para alcançar a bola que corria em direção ao campo de ataque. O camisa 10 era um dos expoentes de uma equipe que contava com jogadores como Juninho, Carlos Alberto, Fagner e Fernando Prass.
Campeão da Copa do Brasil e vice do Brasileirão em 2011, o Vasco era o primeiro grande desafio do Corinthians naquela edição da Libertadores. E agora tinha nos pés de Diego, aos 17 minutos do segundo tempo, a chance de ouro para conquistar a classificação.
23 horas, 23 minutos, 22 segundos. Do outro lado do campo, Cássio analisa a situação. Com a bola ainda muito distante de sua meta, o goleiro lança olhares para os lados e para trás, a fim de encontrar o melhor posicionamento. O adversário vem com tudo. Só resta esperar.
Quem é Cássio Ramos?
Prestes a completar 25 anos, Cássio vivia a grande chance de sua vida. Revelado pelo Grêmio, chegou ao Corinthians após uma passagem frustrada pelo PSV. Começava o ano de 2012 e seu currículo indicava pouco mais de 20 jogos como profissional. Mas a maré mudaria drasticamente.
Começou no dia 29 de março, contra o XV de Piracicaba, quando ganhou de Tite sua primeira chance. O técnico gostou do que viu, mas manteve Júlio César no gol. As falhas do antigo titular na derrota para a Ponte Preta, porém, seriam a gota d’água. A vaga era de Cássio.
A torcida ainda se familiarizava com aquele goleiro grandalhão, de faixa no cabelo e número 24 na camisa amarela, quando ocupou o Pacaembu naquela quarta-feira. Cássio tinha apenas 5 jogos pelo Corinthians. E agora, frente a frente com Diego, precisava mostrar do que era feito.
Como foi o lance da defesa de Cássio contra Diego Souza?
23 horas, 23 minutos, 23 segundos. Enquanto todo o país arregala os olhos, um homem corre particularmente desesperado. Alessandro, capitão da equipe, passaria as noites seguintes em claro, pensando no que seria dele se a bola perdida resultasse em gol. O jeito era rezar.
23 horas, 23 minutos, 24 segundos. Dentre as mais de 37 mil pessoas que acompanham a arrancada de Diego das arquibancadas do Pacaembu, está Tite. Expulso por reclamação, juntou-se ao público e experimentou, naqueles momentos aterrorizantes, o sofrimento de um torcedor comum.
O técnico superou uma eliminação traumática na Libertadores de 2011 para conduzir o Corinthians rumo ao quinto título brasileiro. A missão seguinte tão árdua quanto indisfarçável: conquistar a América pela primeira vez.
E o começo da campanha teve o selo Tite de consistência: 5 vitórias, 3 empates, nenhuma derrota. No jogo de ida das quartas de final, diante do Vasco, um 0 x 0 em que cada palmo de São Januário foi disputado como o último. O roteiro se repetia no Pacaembu – até os 17 do 2º tempo.
23 horas, 23 minutos, 25 segundos. Diego dá, enfim, o primeiro toque na bola, conduzindo-a com o pé direito em direção à meia-lua. O súbito clarão aberto em um confronto marcado pela falta de espaços abria também um buraco na alma do corinthiano.
Disputando o torneio pela décima vez, o Corinthians acumulava uma extensa lista de traumas na Libertadores. E agora, de repente, toda a segurança mostrada por aquele time, toda a confiança na classificação, escorria pelo ralo. O sonho da América estava por um fio.
23 horas, 23 minutos, 26 segundos. Enquanto Diego Souza toca a bola pela segunda vez, arrumando-a para a definição, Cássio corre para diminuir o espaço do atacante, arqueia os joelhos e estica os braços em direção ao solo, como um felino que se prepara para o salto.
Um gol do Vasco, forçaria o Timão virar a partida. Com o 0x0 no Rio, sofrer um gol no Pacaembu era tudo que a torcida temia. A essa altura, sem mais possibilidades de penais, era evidente que a eliminação bateria na porta outra vez.
23 horas, 23 minutos, 27 segundos. Um som indefinido, cada vez mais alto, toma conta do Pacaembu. A respiração é suspensa, a atmosfera é pesada, o momento da definição chegou. Cássio não desgruda os olhos da bola. Diego, já na meia-lua, gira o corpo e chuta com o pé direito.
Cássio salta imediatamente, atirando-se à esquerda para alcançar a bola com a ponta dos dedos. O desvio é leve, mas suficiente para alterar o destino da bola, do jogo, do Corinthians. Ela segue de mansinho, passando a poucos centímetros da trave até cruzar a linha de fundo.
23 horas, 23 minutos, 28 segundos. Cássio se levanta e já orienta os companheiros para o escanteio, sem saber que acabara de iniciar seu caminho rumo à eternidade. Diego se lamenta, Alessandro respira aliviado, Tite sente a alma voltar ao corpo. Segue zero a zero.
Enquanto a torcida vibra nas arquibancadas, uma estranha energia toma conta do Pacaembu. Os velhos traumas parecem dissipar-se no ar. Vem aí o gol do Paulinho, vêm aí mais quatro batalhas, vem aí a conquista da América após 102 anos de espera. Ou seriam oito segundos?